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O SEQUESTRO DO TEMPO

MetrôBH planeja implantar jornadas exaustivas de trabalho que roubam o tempo e a qualidade de vida do empregado

A negociação do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT), referente aos anos de 2024 e 2025, entre o Sindicato e a MetrôBH caminha com divergências. Essas divergências dizem respeito principalmente às propostas de jornada de trabalho e de banco de horas oferecidas pela empresa.

O sistema de transporte público metroviário envolve certas peculiaridades, por exemplo as demandas de trabalho concentradas em determinados horários, como os horários de pico. O impasse reside em conciliar, no mínimo, a preservação dos direitos dos trabalhadores e ao mesmo tempo assegurar o serviço de transporte para a população.

Determinadas jornadas de trabalho variam de acordo com cada setor do sistema metroviário. A empresa impõe no ACT jornadas de trabalho exaustivas: jornadas de 48 horas semanais, escalas de revezamento, jornadas diárias de 12 horas em que o empregado pode chegar a trabalhar 60 horas semanais, excedendo o assegurado pela Constituição Federal – que determina 44 horas semanais de trabalho.

A contrapartida desse excesso é a proposta de adoção do sistema de banco de horas. As horas extras realizadas serão incluídas no banco e o trabalhador pode utilizar da sua reserva para eventuais folgas. No entanto, o que está em disputa é a qualidade do tempo e, assim, a qualidade de vida do empregado, que tem uma vida além do trabalho.

De um lado, a empresa é irredutível quanto as jornadas de trabalho excessivas, pois busca extrair o máximo possível da força de trabalho do empregado, levando-o a exaustão, principalmente após a redução drástica do quadro de funcionários, com as demissões em massa e adesões do Programa de Demissão Voluntária (PDV).

No lado oposto, a militância sindical defende jornadas de trabalho dignas, justas e suficientes – uma luta histórica que remonta desde a primeira greve geral no Brasil, em 1917, em que se reivindicava a redução da jornada de trabalho, pois era imposto trabalhar 14 horas por dia.

REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO: UMA LUTA HISTÓRICA

O movimento sindical desempenha um papel substancial na luta por direitos trabalhistas. Pode-se dizer que é constitutivo de uma sociedade capitalista, atualmente atualizada para o neoliberalismo, a presença da entidade sindical, pois é ela quem freia a velocidade voraz da exploração do trabalho. Ou seja, enquanto houver exploração do trabalho, haverá resistência e luta por direitos.

Uma das principais lutas é a redução da jornada de trabalho, com um passado histórico de avanços, mas também de retrocessos. Trabalhadores brasileiros nas primeiras décadas do século XX conquistaram a diminuição da jornada de trabalho, após o fortalecimento dos sindicatos e aumento do número de greves, até se acordar em 1943, com a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), a jornada de 48 horas semanais.

Na construção da Constituição Federal de 1988, após 21 anos de ditadura militar no Brasil (1964-1985), a classe trabalhadora reivindicou a redução para 44 horas semanais, e assim foi estabelecido. Porém, a história das sociedades não é um tempo linear rumo ao progresso, mas um tempo espiralar com avanços e retrocessos. E assim, com 39 anos sem redução da jornada de trabalho no país, a Reforma Trabalhista, aprovada no governo Temer, veio como uma avalanche de retrocesso. A reforma alterou mais de 100 artigos da CLT e permitiu também a flexibilizações das jornadas de trabalho reforçando o maior poder de barganha do patrão.

JORNADAS DE TRABLHO EXAUSTIVAS: SEQUESTRO DO TEMPO DE VIDA

Somos seres temporais, vivemos no tempo. É essa condição que permite a realização da vida, e também sua finitude. No atual mundo do trabalho, o tempo é colocado em xeque. Para além da incessante aceleração da nossa relação com o mundo, aquele que trabalha tem grande parte do seu tempo ocupado pelo seu respectivo ofício.

Além das 8 horas de trabalho diária, em um exemplo padrão, o tempo médio de deslocamento da casa para o trabalho (ida e volta) ultrapassa 7 horas acumuladas nas grandes cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro – Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), de 2019.

O perecimento no tempo do trabalho, que excede para o tempo de deslocamento no trânsito, atinge diferentemente os gêneros. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) analisou dados de 1995 a 2015 e constatou que as mulheres trabalham em média 7 horas e meia a mais por semana que os homens devido ao acúmulo de tarefas domésticas a elas culturalmente atribuídas.

Para efeito de exemplo, em 2014, o New York Times fez uma matéria sobre uma mãe solteira, chamada Jannette Navarro, que se mantinha como atendente na rede de cafés Starbucks enquanto fazia faculdade e cuidava do seu filho de quatro anos. Ocorreu uma mudança na sua jornada de trabalho, o que as grandes empresas dos Estados Unidos chamam de clopening (clopening seria a junção das palavras close e opening, em tradução para fechar e abrir). É quando um funcionário trabalha até tarde da noite para fechar a loja e então voltar algumas horas depois para reabri-la.

Para as empresas, essa prática visa otimizar e intensificar as horas de trabalho do empregado para os momentos de maior demanda do mercado. Assim, a atendente do café em questão teve seu tempo sequestrado em função de uma jornada de trabalho meticulosamente pensada para extrair o máximo do trabalhador e eliminar o tempo de ociosidade.

Com esse tipo de jornada de trabalho imposta à atendente, Jannette deixou a faculdade e devido aos horários malucos para atender a maior demanda do mercado, ela teve problemas também em conciliar a creche do seu filho.

O exemplo de Jannette é paradigmático e ilustra grande parte das situações dos trabalhadores com jornadas de trabalho exaustivas – vivem para trabalhar e trabalham para viver. Sem tempo para projetos futuros, como se graduar em uma faculdade, o trabalhador e a trabalhadora vivem acorrentados ao tempo de vida que não escolheram, mas se submeteram por questões financeiras, para terem um emprego.

Sindicatos como o dos Metroviários de Minas Gerais lutam por condições de trabalho dignas, defendendo jornadas que permitam aos trabalhadores conciliarem vida profissional e pessoal. Afinal, o trabalho não pode se sobrepor à vida.

 

 

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