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Diploma de nível superior não é mais garantia de emprego

Brasília – Já se foi o tempo em que ter formação de nível superior era quase uma certeza de conseguir um bom emprego. A má gestão da política econômica no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, que já havia desorganizado as contas públicas e feito a inflação disparar, contaminou o mercado de trabalho e atingiu fortemente a população mais qualificada. Entre janeiro e março, o total de desempregados com diploma de curso superior cresceu 21,25% em relação ao mesmo período de 2014, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Embora a taxa desemprego nessa faixa da população não seja a mais elevada – 4,6% dos diplomados estão sem trabalho, contra 9,4% dos que concluíram apenas o ensino médio, por exemplo – o aumento da desocupação foi aí mais intenso, ficando atrás apenas do verificado entre aqueles que têm o ensino superior incompleto (28,2% de alta).

O desaquecimento da economia, que deve fechar neste ano em recessão, com queda de 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo a média das previsões de analistas de instituições financeiras financeiro, enfraquece a esperança de quem acreditava que o diploma seria um passaporte automático para uma boa colocação no mercado de trabalho. Na última década, o governo federal investiu pesadamente no aumento do número de pessoas com formação universitária, facilitando o acesso das pessoas dentro de instituições de ensino públicas e privadas. De 2000 para 2010, o investimento público em educação saltou de 3,5% para 5,6% do PIB — sendo 0,9% para o ensino superior em 2010, segundo o último relatório Panorama da Educação, da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), publicado em 2013. No entanto, a falta de vagas para atender toda a demanda por um posto de nível superior pode formar um “exército de diplomados” com pouco espaço no mercado.

CUSTOS Para Rodrigo Leandro de Moura, professor e pesquisador da área de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), o fenômeno chama ainda mais a atenção pela atipicidade, mesmo em comparação a outros períodos de recessão. “Em crises passadas, as pessoas mais pobres e menos escolarizadas respondiam por uma maior proporção de demitidos. Porém, os trabalhadores com escolaridade media alta são pessoas que ganham mais. Como o salário cresceu muito ao longo dos anos, ficou mais custoso para as empresas manter essa mão de obra qualificada”, avalia.

Na opinião de Moura, o momento é até pior que o da a crise de 2009. “Aquele efeito foi passageiro, e o país conseguiu se recuperar. Havia espaço para crescimento, mas, agora, estamos tendo uma compressão muito grande e forte da massa de rendimento das famílias via mercado de trabalho”, explica. E a tendência é piorar. “O aperto da massa salarial passa pelo menor crescimento da população ocupada e pela menor renda média que cada trabalhador está recebendo. A inflação vai continuar resistente, e, para controlar os preços, o Banco Central vai elevar a taxa básica de juros (Selic). Não há perspectiva de melhora para 2015, e pouca para o próximo ano, que também será difícil”, diz.

DESAFIOS Por representarem um contingente maior da população, profissionais com nível de formação até o ensino médio deverão encarar grandes dificuldades para conseguir um posto no mercado de trabalho. Mas, a realidade para os trabalhadores com nível superior será igualmente desafiadora, nas mais diversas atividades da economia, principalmente na indústria. Diante do ajuste fiscal, com elevação de juros e aumento da carga tributária, o setor que historicamente empregou uma mão de obra mais capacitada vai continuar dando férias coletivas, desligando parques fabris e cortando vagas, dizem os especialistas.

O ambiente recessivo exigirá nervos de aço para profissionais de carreiras mais técnicas, como engenheiros, que precisarão ser perseverantes. Quando concluiu a graduação em engenharia civil, ao fim de 2012, Henrique Leoni Rodrigues, de 25 anos, não esperava enfrentar um declínio na vida profissional. Dois anos antes, ele começou como estagiário em uma empresa do setor de construção, e logo foi promovido a assistente técnico. Ao colocar as mãos no diploma, foi alçado ao posto de engenheiro, e trabalhou em obras de infraestrutura para a Copa do Mundo.

Com a crise, veio a frustração: acabou demitido em julho de 2014. “Os investimentos ficaram mais escassos e muitos profissionais foram mandados embora. Até dezembro, ainda consegui desenvolver alguns trabalhos em parceria com amigos. Mas, desde o início deste ano, está tudo parado”, lamenta. Na procura por afugentar o desânimo pela falta de emprego, Leoni apostou as fichas em uma especialização na área de projetos, execução e controle de obras. “Quero novamente um emprego fixo que me traga realização pessoal e retorno financeiro”, afirma.

Profissionais têm dificuldade para encontrar postos de trabalho compatíveis com seu nível de qualificação. Para especialistas, só a retomada mais forte da economia permitirá a absorção de jovens que estão sendo formados nas universidades.

Constrangidos
Para manter o tempo ocupado, Giselle Bissoli, de 35 anos, exerce atividades na área administrativa da empresa do marido, que tem uma oficina especializada em carros esportivos. Leva uma rotina simples para quem é formada em direito, tem especialização em comércio exterior, fala quatro línguas e visitou 62 países durante os 12 anos de experiência na área. Ela está sem emprego há dois anos. A realidade enfrentada pela advogada é um dos reflexos do desaquecimento da economia, avalia Rodrigo Leandro de Moura, pesquisador do Ibre-FGV. “Quando as empresas contratam em uma recessão, os salários são até menores. É difícil para a empresa fazer um tipo de proposta para alguém mais qualificado, até por uma questão de constrangimento.”

Com PIB fraco, futuro é incerto

Com ou sem especialização, o futuro para os mais qualificados no mercado de trabalho é incerto. Em um contexto de recessão, o baixo nível de atividade econômica exige das empresas que contratem menos empregados. Com mais pessoas tendo acesso ao ensino superior, mas sem um crescimento mais robusto do Produto Interno Bruto (PIB), alguns especialistas não descartam a hipótese de que o nível de desemprego entre os diplomados se aproxime do verificado na camada da população menos instruída. Com menos oportunidades e mais gente concorrendo, faltarão postos.

Para Carlos Alberto Ramos, professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), o PIB precisará manter um avanço contínuo entre 3% e 4% para ampliar a gama de oportunidades para os profissionais mais habilitados. As previsões para o desempenho da economia, no entanto, apontam para um cenário muito menos promissor.

Os analistas do mercado financeiro ouvidos pelo Banco Central na Pesquisa Focus preveem para 2015 uma retração do PIB de 1,27%, com crescimento de 1% para o próximo ano. Para o biênio seguinte, segundo relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI), o país deve crescer 2,25% e 2,3%, chegando a 2,5% em 2020. Nesse ritmo, a presidente Dilma Rousseff corre o risco de passar o comando do país em um ambiente ainda desfavorável pela ótica do mercado de trabalho.

“O crescimento que virá a partir do próximo ano deve recuperar parte das perdas e das vagas fechadas. Contudo, apenas uma taxa de crescimento forte e constante vai permitir, a longo prazo, a geração de postos suficientes para absorver o contingente de jovens que estão sendo formados”, explica Ramos.

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